Educador físico Paulo Pacheco detalha como o Carnaval influencia no aumento do uso e do abuso de substâncias viciantes e detalha os perigos que isso representa à saúde.
Foto: Arquivo/Agência Brasil
Este ano, o Dia Nacional do Combate ao Alcoolismo (18/02) e o Dia Nacional de Combate às Drogas e Alcoolismo (20/02) coincidem com o Carnaval. As datas servem de alerta ao aumento no consumo de substâncias lícitas e ilícitas que causam dependência em milhões de brasileiros.
Para alguns, o Carnaval serve apenas para descansar. Para outros, no entanto, são dias de muita curtição, quando os abusos no consumo de álcool e drogas acabam aumentando o número de ocorrências policiais, de acidentes de trânsito e de internações hospitalares. Para falar desse assunto, o Brasil61 conversou com o educador físico Paulo Pacheco, pós-graduado em Dependência Química e Promoção da Saúde, que atua como consultor em dependência química no Centro Vida Araricá.
Brasil 61: O problema da dependência muda, de acordo com a idade e o sexo da pessoa?
Paulo Pacheco: Com certeza, a dependência muda de acordo com algumas questões particulares de cada indivíduo. Mas, normalmente, os jovens, homens – pessoas do sexo masculino e jovens – são os mais predominantes na questão da dependência. As mulheres têm uma taxa menor de consumo de substâncias, mas estão cada vez mais se aproximando dos homens. Na proporção de três para um. A cada três indivíduos, um é feminino. E também a questão da idade, porque o cérebro ainda está se formando, até mais ou menos a segunda década, o córtex pré-frontal – que é responsável pelo planejamento, tomada de decisões, impulsividade – quanto mais jovens as pessoas começarem a usar essas substâncias, mais vai produzir danos ao cérebro. E aí serão adultos com problemas.
Brasil 61: Nós estamos no período de Carnaval, no Brasil. Por que o consumo de drogas aumenta tanto nesta época do ano? Existe alguma explicação histórica ou cultural para este fenômeno?
Paulo Pacheco: Com certeza o Carnaval é a data festiva mais importante do país. Já é uma questão cultural. As pessoas se preparam o ano inteiro para esses quatro dias de, literalmente – como diz o ditado – caírem na folia. Então, nesse momento de interação da população, as pessoas que já têm um hábito de consumir substâncias, nessas datas aumentam o consumo. E aqueles que ainda não experimentaram, nesses momentos, têm a oportunidade de experimentar sensações novas. Então as pessoas esperam esses momentos para potencializar o uso, para potencializar o prazer, as sensações de euforia, de desprendimento, de socialização, de se sentirem ‘pertencendo a um grupo’. Já no meio social, já ocorre essa condução do uso de substâncias. E a própria mídia, que tem propaganda massiva a respeito do uso do álcool, acaba sendo um indutor do consumo de substâncias.
Brasil 61: Quais são os principais efeitos do álcool, da cocaína e da cannabis, a maconha, no ser humano?
Paulo Pacheco: O álcool é um depressor do sistema nervoso central. Tem uma característica peculiar, que nas primeiras doses ele produz euforia. Logo em seguida, a certo tempo, ela vai deprimindo mais o sistema nervoso central. Nestes momentos de euforia, o álcool produz uma liberação maior dos comportamentos: os freios são anulados. Então a pessoa se sente poderosa, se sente mais desinibida. E há a questão do superego, que é uma questão da psiquê que, digamos que seria um filtro comportamental, que para questões morais, o que é certo, o que é errado… Então, quando você está sob efeito de algo, você vai perdendo cada vez mais essa parte da psiquê, que regula o funcionamento, o comportamento das pessoas. Então coisas que você, sóbrio, você tem um juízo crítico mais apurado, já com efeito de álcool, esses freios são liberados e você faz coisas que normalmente não faria. A cocaína já é um estimulante do sistema nervoso. Ao contrário do álcool, ela acelera o funcionamento do cérebro, produzindo um aumento de batimentos cardíacos e aumento da pressão arterial. A pessoa tem uma sensação de poder muito forte. Da mesma forma, o córtex pré-frontal também é afetado de forma a causar uma maior liberação, uma maior excitação e uma perda do juízo crítico. A pessoa se sente mais poderosa, mais corajosa, produzindo agitação, para algumas pessoas, agressividade, uma fala mais acelerada. E a cannabis, já tem poder de relaxamento, produz algumas alterações da percepção, alterações auditivas e visuais. A questão de tempo e espaço é alterada, a coordenação motora é afetada, também fica mais lenta. Não é à toa que muitos acidentes de trânsito também acontecem com motoristas sob efeito de cannabis.
Brasil 61: Estas três substâncias – o álcool, a cocaína e a maconha – são normalmente as mais usadas no Brasil. Quais outras drogas ameaçam a saúde e por quê?
Paulo Pacheco: Em todas as datas festivas normalmente o álcool, o tabaco, a cocaína e a maconha são as substâncias mais utilizadas. No Carnaval, com certeza, esse uso é potencializado e tem uma característica cultural, inclusive com uso dos inalantes – o conhecido lança-perfume – que hoje são construídos, fabricados de forma artesanal, em fundos de quintal, conhecidos como loló… São altamente prejudiciais, também. E no carnaval, especificamente, são mais utilizados. Além das anfetaminas, que são drogas da moda, que são o ecstasy e o LSD, as drogas mais sintéticas, que têm um aumento mais exponencial na população, e a maconha sintética – o chamado skank – que têm alto poder de THC.
Brasil 61: Quais são os riscos e prejuízos à saúde do uso dessas substâncias?
Paulo Pacheco: Com certeza, não existe uso sem riscos. Por menor que seja a dose. Qualquer substância que altere a percepção, produz um risco. Por menor que seja, nenhum uso é seguro dessas substâncias. Mas é claro que, conforme o aumento desse uso, os riscos aumentam, das mais variadas características: acidentes de trânsito, acidentes de trabalho e alterações de consciência. Como eu já citei, o córtex pré-frontal, principalmente é afetado, que é o responsável pelo planejamento, pelo raciocínio, pela reflexão. Eles são de uma certa forma anulados, anestesiados – esse lobo frontal – e aí, os filtros não agem da forma correta. Então os comportamentos ficam mais alterados, produzindo uma impulsividade maior. Ou seja: ações sem planejamento, sem raciocínio, a agressividade, aumenta o suicídio, alterações de humor, perda de juízo crítico, perda de memória, transtornos de ansiedade, depressão, gravidez indesejada. Estes são os riscos e prejuízos maiores à saúde da população.
Fonte: Brasil 61